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Pedágio na ERS-118: lideranças e comunidades querem mais tempo para discutir a proposta

Após o anúncio do governo gaúcho que o plano de concessão de rodovias prevê um pedágio na ERS-118, diversas representações de setores reagiram contra a cobrança. Conforme a proposta do governo, a praça será localizada no km 22,6, em Gravataí, próximo da freeway. O valor cobrado poderá chegar até R$ 7,39.

O assunto gerou polêmica, e resultou na criação do Movimento RS-118 Sem Pedágio, formado por lideranças dos municípios cortados pela estrada que liga Viamão a Sapucaia, que pedem que o governo retire o trecho do pacote de concessões que vai entregar 20 rodovias gaúchas à iniciativa privada por 30 anos. O tema foi tratado em audiência pública da Comissão de Segurança e Serviços Públicos da Assembleia Legislativa, na manhã desta quinta-feira (08), em atividade virtual proposta pelas bancadas do PT e PSOL. Embora convidados, os representantes do governo gaúcho não participaram da audiência.

O presidente da Comissão, deputado Edegar Pretto (PT), diz que o debate atende ao pedido das lideranças de Alvorada, Cachoeirinha, Esteio, Gravataí, Nova Santa Rita, Porto Alegre, São Leopoldo, Sapucaia do Sul e Viamão, municípios que têm envolvimento direto com o trecho da ERS-118. Conforme o parlamentar, há preocupação a respeito do pedágio na região, por se tratar de uma via de grande fluxo da região Metropolitana de Porto Alegre. Outros dois fatores polêmicos em relação à proposta do governo, dizem respeito a falta de isenção de tarifa para veículos da mesma cidade das praças de pedágio, como hoje ocorre na RS-040, em Viamão, e o fato da duplicação da rodovia ter sido feita com recursos públicos.

Pretto lembrou que a ERS-118 cruza áreas urbanas de uma região que é um polo logístico industrial. Citou que o pedido do Movimento RS-118 Sem Pedágio é que a rodovia não seja concedida para a iniciativa privada, nem pedagiada, tanto nos trechos duplicados quantos nos trechos não duplicados. “Nossa Comissão acolheu o pedido e abrimos o debate com a sociedade. O governo Eduardo Leite propôs três audiências públicas de três horas cada. Ou seja, um projeto de 30 anos que vai ser debatido em nove horas, ao todo”, alerta. Como exemplo, Pretto citou ainda que no bloco 1, que terá nove praças, se dividir as três horas por cada praça, significa que cada praça vai ser debatida por 20 minutos.

O deputado ainda questionou o impacto do pedágio no custo de vida da população, principalmente sobre a cesta básica no Rio Grande do Sul, considerada a mais cara do país. “Sem dúvida isso vai pesar muito na vida da população”, avalia.

O governo anunciou para os dias 12, 13 e 14 de julho as datas das consultas e audiências públicas para discutir com a população sobre os editais. Concluídas essas etapas, passará por análise da Agência Estadual de Regulação dos Serviços Públicos Delegados do Rio Grande do Sul (Agergs) e depois os editais serão publicados e a data dos leilões serão marcadas.

Para Darcy Zottis, coordenador do Movimento RS-118 Sem Pedágio, a proposta do governo vai inibir novos investimentos, além de aumentar o custo para moradores e empresas, inclusive forçando empreendimentos a migrarem para outros municípios que não possuem pedágio. A estimativa é que mais de 50 mil moradores de Alvorada e mais de 90 mil de Viamão se deslocam diariamente para trabalhar em municípios vizinhos. “É inadmissível penalizar com um pedágio por 30 anos toda uma região que está entre os 10 menores PIBs do Estado, por 16 km de duplicação”, ressalta.

Rafael Goelzer, vice-presidente de micro e pequenas empresas da Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande Sul (Federasul), diz que a entidade é favorável aos pedágios, desde que sejam criados de forma correta e eficiente. “Estamos discutindo 16,5 km de estrada porque achamos que há um equívoco na escolha da ERS-118, por se tratar de uma rodovia em área urbana, portanto não deve ter pedágio. Isso traria menos incentivos para empreendimentos empresariais na região”, observa.

A deputada Luciana Genro (PSOL) lamentou a ausência de representante do governo na audiência pública, evidenciando a falta de diálogo do Executivo gaúcho. Ela diz que os únicos beneficiados com a proposta de Leite são as empresas que exploram pedágios. “A ERS-118 demorou 20 anos para ser duplicada e no momento em que ela fica pronta o governo quer entregar à iniciativa privada para explorar o pedágio. Está óbvio que é uma ação privatista, com a intenção de favorecer esses grupos econômicos. Isso prejudica cidades que são as mais sofridas da nossa região Metropolitana, as mais empobrecidas, as mais discriminadas”, aponta.

Para Paulo Ziegler, representante da Comissão de Infraestrutura da Federação das Empresas de Logística e de Transporte de Cargas do RS (Fetransul), é preciso mais tempo para analisar a proposta do governo, porque se trata de um assunto que pode repercutir por 30 anos no RS. “O governo propõe que tenhamos menos de 60 dias para analisar o que eles levaram 550 dias para pensar. Isso é muito pouco, nós estudamos o projeto e temos muito a dizer a respeito do modelo que está proposto”, destaca.

Ziegler explica, por exemplo, que há uma ideia de que em 30 anos a frota de veículos nesses lugares onde vai ocorrer pedágio vai dobrar, ou mais que dobrar dependendo das praças envolvidas. Segundo ele, a população do Rio Grande do Sul não vai crescer mais de 1% em 30 anos. “Isso significa dizer que essa projeção feita pela empresa contratada pelo BNDES, se errada, vai repercutir na tarifa. Ou seja, essas tarifas que já não são baratas, vão ser ampliadas por conta de um planejamento otimista demais”, avalia.

Como encaminhamento da audiência pública, o deputado Edegar Pretto informou que será formalizado um pedido de agenda ao governador Eduardo Leite, ao Tribunal de Contas do Estado e ao Ministério Público, com o objetivo de adiar as audiências públicas agendadas pelo governo para a próxima semana. O entendimento é que se precisa mais tempo para analisar e discutir a proposta com  toda a população que será impactada.

A ideia ainda é formalizar um pedido ao presidente da Assembleia Legislativa, deputado Gabriel Souza (MDB), para que o parlamento também se mobilize e faça parte desse debate em torno do projeto do governo do Estado.

Histórico de duplicação da ERS-118 

O projeto de duplicação dos 22,4 quilômetros da RS-118 é de 1996, mas o contrato de execução do Lote 1 foi assinado apenas em julho de 2006, no Governo Rigotto, mas sem nenhuma execução. O Governo Yeda assinou o contrato do lote 2 em dezembro de 2010 e realizou um pouco mais de 1 km de pista do lote 1.

Somente a partir do governo Tarso Genro a obra andou, com realização de 11 km de pista nova, restauro de 2 km da pista velha, a construção da elevada na Marechal Randon, viaduto da ERS-020, fundações do Viaduto da Itacolomi e terraplanagem do viaduto de acesso Augusto Ritter. Até janeiro de 2011, diversas famílias ainda moravam na faixa de domínio, quando foi criado o aluguel social, realocando 1.076 famílias que então viviam nas margens da rodovia. Foram investidos mais de R$ 100 milhões somente neste período. Após, em 2015, o governo Sartori parou as obras, e retomou apenas em 2017.

No contexto do plano do atual governo será extinta a Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR), que atualmente administra a maioria das estradas que integram o pacote nos próximos 30 anos de concessões.

O que dizem as representações

Naderson Viegas Soares – morador de Viamão: “Nosso município já sofre há muitos anos com a falta de empresas. Esse pedágio só vai prejudicar o desenvolvimento de Viamão. O que existe por parte do governo Leite é uma falta de sensibilização, principalmente no meio de uma pandemia”.

Ary Vanazzi – prefeito de São Leopoldo: “Devemos fazer uma discussão sobre o ponto de vista de desenvolvimento da região Metropolitana. Não há dúvida que os pedágios vão encarecer a vida da população. Quem vai pagar essa conta é a população Precisamos estender esse debate para outros prefeitos das regiões vizinhas, num debate regional. Isso diz respeito ao desenvolvimento econômico”.

O que dizem os deputados

Pepe Vargas (PT) – coordenador da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos dos Usuários das Rodovias Pedagiadas no RS que será instalada oficialmente na próxima terça-feira: “Não cabe estabelecer praças de pedágios em áreas urbanas Esse foi o mesmo processo vivenciado em 1995 no governo Britto, que foi um cheque em branco. Defendemos a prorrogação desse prazo de discussão, que não pode ser tão acelerado. Vale lembrar que são 30 anos de concessão”.

Sofia Cavedon (PT): “Essa região é de um um conglomerado de municípios que vão pagar essa conta. Não dá para decidir 30 anos em três audiências propostas pelo governo, que vão durar nove horas ao todo. Precisamos ganhar tempo para que a sociedade tenha conhecimento do que se trata esse projeto. Isso diz respeito ao custo de vida das pessoas”.

Issur Koch (PP): “A Sociedade Gaúcha já pagou a conta da ERS-118 duas vezes. Se colocar pedágio, só falta colocar um nariz de palhaço em nós. O governo gaúcho quer impor esse pedágio para a população, mas se depender do nosso empenho isso não sairá do papel”.

Tiago Simon (MDB): “Sou frontalmente contrário a essa absoluta falta de noção que é colocar um pedágio na ERS-118. É um modelo absolutamente equivocado que só privilegia a arrecadação do governo. Outros estados têm trabalhado com foco na menor tarifa e objetivando um preço mais em conta para a população. No caso da 118, não há o que discutir. Não cabe pedágio”.

Também participaram da audiência vereadores e moradores dos municípios da região Metropolitana de Porto Alegre.